terça-feira, 8 de julho de 2014

Preconceito e a rejeição dos habitantes negros Santa Teresa.


Centro de  Santa Teresa
Nos caminhos da imigração italiana, origem europeia que predominou na colonização do município capixaba de Santa Teresa, vieram também o preconceito e a rejeição dos habitantes negros desta região.


Casa da Família Lambert - primeira moradia de Santa Teresa construída em 1875, pelos irmãos Antônio e Virgílio Lambert.
Na segunda metade do século XIX ocorrem alguns fenômenos importantes que irão traduzir algumas modificações na estrutura econômica e social do pais, contribuindo para o desenvolvimento relativo do mercado interno e estimulando o processo de urbanização. A transição do trabalho escravo para o trabalho livre: a cessação do trafico em 1850, a abolição em 1888 e a entrada de numerosos imigrantes no país (COSTA, 1998).
Desde a vinda de D. Joao VI para o Brasil tem-se em pauta a discussão sobre imigração. No inicio o problema era demográfico, faltavam pessoas para povoar o Brasil, e iniciou-se a formação de núcleos coloniais formados com imigrantes alemães, italianos e outros. A partir de meados do século, com a extinção do tráfico internacional de escravos, em lugar de imigrantes pequenos proprietários passou-se a promover uma politica que visava fornecer braços para a lavoura, mudando assim sua orientação que antes era colonizadora. O iminente fim da escravidão e a crescente expansão cafeeira exigiam uma solução para o problema de mão-de-obra. Os imigrantes tornaram-se a solução imediata (COSTA, 1985).
Esta fonte de dados de Costa nos mostra dados genéricos sobre o processo de colonização e imigração brasileiros, sob o ponto de vista da comunidade negra, principalmente nas regiões interioranas.
Atualmente, com população estimada em 23.432 habitantes (IBGE, 2013) Santa Teresa é uma cidade acolhedora, com heranças culturais fortemente ligadas às tradições italianas, mas também com traços alemães, africanos e de tantas outras influências ao longo de sua existência.
Entretanto, parte da história de nosso município, é desconhecida por muitos descendentes. Trata da tirania de um militar italiano, no final do século XIX, Capitão Vivaldi contra os negros que residiam e trabalhavam em Santa Teresa, principalmente na comunidade de São João de Petrópolis. O mascate José Calhau, viajante e astucioso, ao passar por essas terras, resolveu dar à Vivaldi o que ele merecia, diante de tantos maus tratos e violências cometidas contra seus companheiros negros.

Instalações do IFES, Campus Santa Teresa, antigamente denominada Escola Agrotécnica Federal de Santa Teresa, localizada em São João de Petrópolis
Em 2 de novembro de 1898, Calhau e seu bando invadiram Barracão de São João de Petrópolis, surpreendendo os capangas do capitão. Muitos da milícia dele morreram. Não houve baixas no grupo de invasores. O bando de Calhau incendiou casas e até o cartório da região foi destruído. Ainda hoje há dificuldades para conseguir informações sobre registros antes do ano de 1898 na região porque os livros foram queimados.
Calhau e seu grupo dominaram Vivaldi e decidiram dar ao capitão o mesmo tratamento dispensado aos negros. Vivaldi foi espancado e apunhalado diversas vezes. Com o objetivo de dar ao capitão uma morte lenta e dolorosa, Calhau decidiu atear fogo no sobrado de Vivaldi, para que ele fosse queimado vivo, mas Vivaldi foi resgatado pelos capangas sobreviventes. Os registros de sua morte datam de 9 de novembro de 1939. já sobre Calhau não há indícios de seu destino após o feito.
A bela frase que define nossa cidade: “primeira cidade brasileira fundada por imigrantes italianos, a pequena Santa Teresa, rodeada de altas montanhas, está localizada na região serrana do Estado do Espírito Santo”, infelizmente oculta esses e talvez outros acontecidos que marcaram com sangue a trajetória negra na colonização de Santa Teresa.
De acordo com o historiador Fausto (2002, p. 87):
“apesar das variações de acordo com as diferentes regiões do país, a abolição da escravatura não eliminou o problema do negro. A opção pelo trabalhador imigrante, nas áreas regionais mais dinâmicas da economia, e as escassas oportunidades abertas ao ex-escravo, em outras áreas, resultaram em uma profunda desigualdade social da população negra. Fruto em parte do preconceito, essa desigualdade acabou por reforçar o próprio preconceito contra o negro. Sobretudo nas regiões de forte imigração, ele foi considerado um ser inferior, perigoso, vadio e propenso ao crime; mas útil quando subserviente”.
Vale lembrar que em 1888, quando a Lei Áurea foi assinada, o Brasil era um dos últimos países no mundo a abolir a escravidão. Eternizada no tempo (e nas cartilhas escolares), como uma liberdade concedida de forma paternalista pela princesa Isabel, a abolição foi, sobretudo, uma consequência natural para anos de atuação e luta de escravos, libertos, intelectuais, jornalistas negros e mestiços, em prol de seus próprios direitos.

REFERÊNCIAS

COSTA, Emília Viotti da. Da senzala à colônia. 4.ed. São Paulo: Ciências Humanas, 1998.

BIASUTTI, Luiz Carlos e LOSS, Arlindo. Revolta do Calhau. Matéria em A Tribuna, baseada no livro São Roque do Canaã – Uma história de Fé, Trabalho e Vitórias. Compilação Walter de Aguiar Filho, julho/2013. Disponível em: http://www.morrodomoreno.com.br/ materias/revolta-do-calhau.html. Acesso em 08/07/2014.

FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: EDUSP, 2002.



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